Escola Básica Afonso de Paiva - Castelo Branco
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Breve introdução - a necessidade da existência do Projeto

A Escola, entendida como espaço de cidadania, de convívio e de educação, necessita de um Projeto que sugira temas prioritários a abordar no âmbito da "Educação para a Saúde", dinamize atividades que promovam a saúde individual e/ou coletiva de todos os que fazem parte da comunidade educativa e que faça a articulação das iniciativas entre os vários ciclos de escolaridade. Face à legislação em vigor, os temas considerados prioritários são a "Alimentação e Actividade Física", "Consumo de substâncias psicoativas", "Sexualidade", "Infeções sexualmente transmissíveis, designadamente VIH/SIDA" e "Violência em meio escolar". A seleção dos conteúdos para cada um destes temas teve em consideração as caraterísticas da Comunidade Educativa do Agrupamento e as especificidades das áreas onde serão prioritariamente desenvolvidos - nas disciplinas curriculares (C. Naturais ou outras), em Cidadania e Desenvolvimento, no Vós Alunos e/ou como atividade extracurricular.

quarta-feira, 27 de abril de 2016

A importância do toque, os laços afetivos e a manutenção do equilíbrio emocional

Eu acredito que é possível conhecer o grau de apoio que o outro tem a dar através de um longo abraço.

Na década de 40 do século passado, os profissionais de saúde tinham já uma apurada consciência da presença de bactérias e microrganismos, e dos riscos que esses implicavam para a saúde dos bebés recém-nascidos. A mortalidade infantil nos EUA era nessa altura elevadíssima, pelo que, nos hospitais, tentavam não tocar muito nos bebés, nem sequer pegá-los ao colo.
O psicanalista René Spitz andava nesta fase intrigado com um fenómeno que se constatava nas instituições em que os bebés eram separados das mães (órfãos ou filhos de presidiárias): era nestas instituições em que a mortalidade era maior, mesmo quando se encontravam bem equipadas e com boas condições de higiene.
René Spitz debruçou-se sobre este assunto, vindo a concluir, com a sua investigação, que o contacto humano e a interação afetiva são indispensáveis para a sobrevivência do ser humano nos primeiros tempos de vida.
É por isso que, hoje em dia, quando nasce um bebé prematuro, é provável que, na unidade de cuidados intensivos, seja pedido à mãe para colocar o bebé junto ao peito, num gesto de afeto que os profissionais de saúde designam por técnica do canguru. Os números são reveladores: a Organização Mundial de Saúde assinala que esta prática reduz as infeções nos recém-nascidos em cerca de 50%.
A importância deste aconchego está patente numa outra experiência que se tornou bem conhecida da ciência. O psicólogo Harry Harlow descobriu que os macaquinhos-bebé, quando separados dos outros membros da família, preferem uma máquina fornecedora de comida que se pareça com uma mãe-macaco, em vez de tubos, manípulos e manivelas. É também nesta "mãe" substituta que os macaquinhos se refugiam perante um estímulo assustador. Harlow acha que a evolução colocou o primeiro alimento dos mamíferos no peito das mães, não pelas vantagens do leite, mas para garantir que eles passem mais tempo juntos e estabeleçam laços.

O psicanalista John Bowlby foi revolucionário nos anos 50 ao defender que os bebés nascem com o instinto, a necessidade inata de estabelecer uma ligação com a mãe, ligação esta que ele designou de vinculação. De facto, desde então, muitos têm sido os estudos realizados sobre a relação mãe-bebé, designadamente os de Mary Ainsworth, que aprofundou o impacto  da vinculação no desenvolvimento e na personalidade da criança. Efetivamente, a importância da vinculação reconhece-se hoje incontornável. A pessoa mais próxima do bebé, geralmente a mãe, assume o papel de figura de vinculação e constitui-se como base segura, de onde o bebé parte para explorar e descobrir o mundo, mas onde regressa à procura de conforto e segurança, quando se sente ameaçado ou em perigo. A qualidade da vinculação interfere no comportamento e bem-estar dos indivíduos, em diversos momentos e vários domínios do seu desenvolvimento, inclusive na idade adulta. Com base na mesma teoria, diferentes investigadores (Muderrisoglu, Levy, Jordan, Searle) constataram que indivíduos que estabeleceram uma boa vinculação, em comparação com sujeitos cuja vinculação foi mais pobre, revelam valores mais baixos de stress, usam estratégias defensivas mais adequadas, são menos impulsivos e menos propensos à depressão, agressividade, consumo de álcool e drogas, raiva e ansiedade. Contudo, estas implicações não constituem uma condenação obrigatória, pois, segundo Maria Cristina Canavarro, investigadora da Universidade de Coimbra, as relações estabelecidas pelo adulto podem ter um importante papel reparador. No livro que resume a sua pesquisa, Relações Afetivas e Saúde Mental, Maria Cristina Canavarro assinala que a saúde mental das pessoas que sentem que tiveram pouco suporte emocional dos pais na infância ou na adolescência depende da qualidade das relações afetivas que vieram a vivenciar na idade adulta.
No fundo, a importância do contacto físico, da proximidade, da segurança do afeto, do amor permanece durante toda a vida. Em 2000, os psiquiatras Thomas Lewis, Fari Amini e Richard Lannon juntaram-se para compilar décadas de conhecimento transdisciplinar sobre o amor. No seu livro Uma Teoria Geral do Amor, reforçam que "as crianças não são as únicas cujos corpos reagem à complexidade de uma perda: a função cardiovascular, os níveis das hormonas e os processos de imunidade passam por alterações nos adultos que sofrem uma separação prolongada".
Muitos autores referem que o toque, o abraço, são extremamente terapêuticos, como é o caso da enfermeira Dolores Krieger que demonstrou, na sua investigação em meio hospitalar, que o toque produz significativas alterações fisiológicas em pessoas com diferentes tipos de doenças. Professora na Escola de Enfermagem da Universidade de Nova Iorque, Dolores Krieger  conduziu diferentes estudos sobre os efeitos do toque e, repetidamente, verificou que, quando a pessoa é tocada, o "nível de hemoglobina no sangue aumenta, o que representa uma maior oxigenação de todos os órgãos do corpo, incluindo coração e cérebro. O aumento da hemoglobina ativa todo o corpo, previne doenças e acelera a recuperação do organismo no caso de alguma enfermidade."
Sue Gregory e Julie Verdouw estudaram o impacto do toque terapêutico na diminuição da dor em pessoas com várias patologias, tendo encontrado uma impressionante diminuição de 40%. Verificaram que feridas cirúrgicas cicatrizam mais rapidamente e desenvolvem menos infeções, as queimaduras recuperam melhor, e o medo e a ansiedade são mais fáceis de gerir.
David Bresler, psicólogo, enquanto fundador e diretor da Unidade de Controlo da Dor da Universidade da Califórnia, também chegou a receitar abraços aos seus pacientes, assim como o reconhecido psiquiatra da Fundação Menninger, Dr. Harold Voth. Segundo o mesmo, e tendo já sido provado que a depressão influencia o sistema imunitário, os abraços - enquanto manifestação física de afeto - funcionam como um excelente antidepressivo, reforçando o sistema imunitário. De tal forma que a enfermeira Katheleen Keating escreveu um livro intitulado A Terapia do Abraço.
Com todos estes benefícios, é simples perceber como o "movimento de abraços grátis" se estendeu a mais de 80 países, segundo o site da Free Hugs Campaign (http://www.freehugscampaign.org/). Tudo começou quando, em 2004, o australiano Juan Mann decidiu colocar-se no cruzamento mais movimentado de Sydney segurando um cartaz onde se lia, dos dois lados, "abraços grátis"!
Este gesto correu mundo e o princípio é simples: oferecer um abraço a um desconhecido, fazer o dia de alguém um pouco melhor... relembrando como, atualmente, o amor e as manifestações de afeto são tantas vezes relegadas para segundo plano.
No seu livro, Thomas Lewis, Fari Amini e Richard Lannon lembram Walker Percy: “o homem moderno alheia-se da essência, da sua própria essência, da essência das outras criaturas do mundo, da essência transcendental. Ele perdeu algo - o quê, ele não sabe; só sabe que está aborrecido de morte, por causa de o ter perdido”. Dizem os autores que "o elemento misterioso ausente, consiste numa imersão profunda e duradoura em laços comunitários. O amor, em todas as suas formas variadas e múltiplas, é o eixo em torno do qual rodopiam as nossas vidas. Sem essa âncora biológica, todos nós somos atirados para fora, sozinhos, para uma escuridão nociva".
Por este motivo, há também quem se tenha lançado de pés e cabeça à procura de uma nova forma de viver. A Humaniversity foi fundada em 1978, na Holanda, sendo uma comunidade terapêutica e ao mesmo tempo uma escola. Descreve-se como uma universidade para o crescimento, desenvolvimento e realização do ser humano. Funciona como uma família estendida que se rege pelos valores do amor, respeito, cuidar uns dos outros, responsabilidade, cooperação e honestidade. Diz Veeresh, o fundador, que o ser humano precisa primeiro de amor, depois precisa de amar e, finalmente, neste processo de dar e receber, é criado o amor por si próprio. A amizade, o elemento central em estudo na Humaniversity, é considerada a mais elevada experiência da arte de ser humano (http://humaniversity.com/).
E se a Universidade da Amizade parece demasiado afastada da realidade do nosso dia-a-dia, é altura de prestar atenção a uma professora de Enfermagem da Universidade do Colorado. Além de autora com publicações a nível internacional, tornou-se também mentora de enfermeiros no mundo inteiro que mudaram o seu trabalho de acordo com as suas orientações (designadamente as Escolas Superiores de Enfermagem de Angra do Heroísmo e Maria Resende, em Lisboa). Diz a autora: “em vez de nos perguntarmos como nos podemos atrever a trazer amor para as nossas vidas e para o nosso trabalho, podemos perguntar-nos, como podemos suportar não o fazer?".
Aguardemos o futuro em que a "ciência do amor" conquiste o espaço merecido nas prioridades do sistema de saúde, no Ministério da Educação, no Código do Trabalho, na ação dos políticos e na nossa lista de prioridades quotidianas.
Eu acredito que é possível conhecer o grau de apoio que o outro tem a dar através de um longo abraço. E além de apoio e segurança, é comprovado que o abraço faz bem à saúde.
Sendo assim, um abraço a todos!

A Psicóloga Cidália Ribeiro

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